A educação básica e o ensino na Coreia do Sul
A educação básica e o ensino na Coreia do Sul
Valor dado aos professores é um dos principais aspectos do sistema de ensino do país
Falamos no texto anterior sobre os programas de MBA da Seoul National University, e as oportunidades que programas na Ásia podem representar.
Para entender melhor os aspectos culturais que influenciam a educação na Coreia do Sul, conversei com o Gustavo Wigman, presidente do Instituto Vertere, que esteve na Coréia para entender o modelo utilizado por lá.
Logo de cara, uma das diferenças básicas que ele diz ter notado foi o valor dado aos professores.
“Na Coreia do Sul, os professores estão entre os membros mais respeitados da sociedade e as faculdades de magistério estão entre as mais cobiçadas e concorridas. Os salários são muito bons e os professores bons de mídia se transformam em celebridades milionárias, chegando a faturar alguns milhões de dólares por ano. Só o fato de chegar no país e falar que é professor, já abre portas e faz com que você ganhe sorrisos. A profissão é muito respeitada”, contou Gustavo.
A obsessão pelos estudos pode parecer um exagero, mas o objetivo das famílias não é somente garantir boas condições de vida e status social para seus filhos. Elas acreditam que a educação ajuda o país a se desenvolver e a se projetar internacionalmente, e são muito orgulhosos do histórico de sucesso que tiveram nos últimos 60 anos.
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No Brasil, por exemplo, seria impensável que uma criança frequentasse uma escola particular e outra pública ao mesmo tempo. Mas por lá, é exatamente isso que acontece.
“Os pais são estimulados a investir no ensino escolar de seus filhos e vêm gastando cada vez mais com aulas particulares complementares (conhecidas como hagwons) para seus filhos. Essas aulas podem ser dadas em salas de aula ou pela internet e a rotina é bastante pesada, chegando a ultrapassar 16 horas diárias de estudo. Os pais, principalmente as mães, são muito presentes e a pressão sobre as crianças é grande”, explica Gustavo.
Nesse sentido, o modelo de educação coreano é exatamente o oposto do implantado na Finlândia e em Países Nórdicos, por exemplo, onde não é incentivado muito tempo na escola, e nem estudos pesados para as crianças, apenas existe a figura de um professor em quem os pais confiam.
Para se ter uma ideia da importância das datas ligadas ao ensino, o vestibular é considerado uma das datas mais importantes do calendário do país. Gustavo me contou alguns fatos bem curiosos sobre isso:
“O vestibular na Coreia é um evento nacional e é considerado um assunto de vida ou morte para os estudantes coreanos. O exame é tão importante que o governo chega a proibir pousos e decolagens de voos comerciais durante certo horário para garantir o silêncio total durante as provas. A polícia pede aos motoristas para não buzinar ao passar pelas escolas, e equipes de voluntários da polícia chegam a escoltar estudantes presos em engarrafamentos para chegarem a tempo no exame. Em alguns locais de prova, a população vai às ruas para aplaudir os alunos que chegam. Pertencer ao clube SKY (iniciais das três universidades mais prestigiosas do país – Seoul, Korea e Yonsei), é como pertencer a um clube de elite”, conta.
Esta pressão toda também traz consequências negativas. O suicídio entre os jovens sul-coreanos que fracassam no vestibular nacional é alarmante, assim como o nível de infelicidade dos alunos. Nos 2 quesitos, a Coreia apresenta os piores indicadores entre os países da OECD. Por outro lado, a Coréia tem se mantido entre os 10 primeiros lugares em educação no mesmo ranking da OECD, juntamente com países nórdicos, que apresentam uma metodologia completamente diferente. Neste mesmo ranking, o Brasil está depois do 60o lugar.
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As famílias, preocupadas com a situação, começaram a olhar para oportunidades fora do país. Foi assim que começaram a capacitar os mais jovens para que fizessem vestibulares fora da Coréia. Por que não ser número 1 no MIT, em Harvard ou em Stanford?
“O país vem sofrendo um êxodo em massa de estudantes. Milhares de famílias têm enviado seus filhos pré-universitários para serem educados em países como Nova Zelândia, Austrália, EUA, Canadá e Reino Unido. As crianças tipicamente viajam acompanhadas das mães, enquanto os pais permanecem na Coréia para trabalhar e financiar a empreitada. Apesar da enorme tensão financeira, emocional e cultural, esses pais acreditam que enviar seus filhos para o exterior lhes dará uma fuga do sistema escolar notoriamente cruel da Coréia e uma oportunidade de dominar o inglês, um símbolo de status elevado que contribui não só para o sucesso profissional dos jovens, mas também na busca do parceiro para o casamento”, comenta Gustavo.
Este movimento abriu uma janela interessante para os colégios particulares. Com o aumento da demanda para o aprendizado do inglês e para os intercâmbios familiares para os países ocidentais, os tradicionais cursos de inglês se transformaram em ‘Learning Centers’, oferendo um currículo completo de matérias ministradas em inglês, além de habilidades socioemocionais para ajudar os alunos a se adaptarem melhor às culturas ocidentais.
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“O modelo dos Learning Centers coreanos é muito interessante, pois deixaram de ser escolas ‘de’ inglês para se tornarem escolas ‘em’ inglês. Ao mesmo tempo que aprofundam o conhecimento dos alunos nas matérias trabalhadas na escola regular, importantes para o bom desempenho no vestibular nacional, estes centros de aprendizado preparam os alunos para faculdades de primeira linha fora do país que, em um mundo cada vez mais globalizado, pode render até mais sucesso profissional para os seus alunos. Ao trabalhar diversas matérias em inglês, o aprendizado do idioma é acelerado e os alunos claramente se engajam mais com os conteúdos. Assim como no Brasil, os jovens na Coreia questionam com razão os conteúdos chatos tipicamente abordados nos cursos tradicionais de idiomas”, complementa.
É um pouco por aí que, mesmo com uma cultura muito bairrista, em que “o que é coreano é que é bom”, um choque geracional já começa a aparecer.
Enquanto os mais velhos pagam mais para terem bens produzidos por empresas coreanas como a Samsung e a Hyundai, os mais jovens, vistos como rebeldes, usam IPhone e andam de BMW.
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Mesmo assim, ainda é comum vermos os coreanos falando com orgulho que “a Samsung é muito melhor que as empresas americanas…” ou que a “Hyundai cresceu muito!”.
As Universidades coreanas também começaram a se incomodar, perdendo os seus high performers para os EUA e estão cada vez mais bem capacitadas e com apelo global.
Notamos que, ao mesmo tempo que existe um interesse dos melhores alunos em estudar fora do país, como acontece aqui no Brasil, há também grandes diferenças, como por exemplo a grande pressão e cobrança para os estudos em geral e vestibular. Como em todos os casos, isso traz consequências positivas e negativas para a atual situação da Coréia do Sul. Sabendo dos prós e contras, o que acharia de experimentar essa mudança de mindset morando na Coréia do Sul e outros países da Ásia?
Sobre o Instituto Vertere
Desde a década de 1990, a equipe do Instituto Vertere esteve envolvida na criação e execução das principais provas olímpicas do Brasil, incluindo Astronomia, Física, Biologia, Geografia, Informática, Linguística, Economia, Medicina e a Sapientia – Olimpíada do Futuro.
Além de se envolver na elaboração das provas e organização dos eventos olímpicos, o Instituto tem se dedicado a auxiliar colégios públicos e privados a incorporar estas disciplinas em suas grades curriculares, capacitando professores e apoiando no planejamento e acompanhamento de turmas olímpicas.
Sobre o Gustavo Wigman
Atua no mercado de educação desde 2007 nos ramos de estratégia e finanças. Recentemente, tem auxiliado colégios no desenho e execução de suas estratégias de crescimento e é presidente do Instituto Vertere, ONG voltada para projetos de educação e empregabilidade, com forte atuação em projetos de olimpíadas do conhecimento.
*Fernanda Lopes de Macedo Thees fundou a Loite em 2007, onde trabalha com desenvolvimento de profissionais principalmente através do Coaching e MBA Prep. Mora em São Paulo, mas adora viajar, seja para Juiz de Fora para ver a família e amigos, ou pelo mundo